sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Monólogo de uma demente


Monólogo
Cena 1
Da platéia, a atriz sai
_Alguém pode me dizer o que é a loucura?
_Ei, o senhor sabe me dizer por que há tanto louco hoje em dia?
_A senhora aí, acha que tenho cara de louca?
_Ah, você se acha louco? Pode falar não se envergonhe não!
_Alguém, na platéia, conhece algum louco?
_Existe alguém aqui que, por acaso, conhece a Juliano Moreira?
_O papo é sério!

Cena 2
Num canto qualquer da platéia, já incorporando pouco a pouco o seu personagem
_Eu tenho certeza que sou louca! Louca...louca...louca!
Pudera! Desde de criança, sempre me chamaram de louca! Meu irmão, então era quem mais me chamar assim.

Cena 3
A atriz já no palco; vozes narradas como se fossem de sua lembrança (no auto-falante); dissonantes. A atriz corre de um lado pra outro.
“Essa menina é louca!”
“Que louca é essa garota!”
“Louca!”
“Louca...! Sua louca!

Cena 4
A atriz totalmente incorporada numa louca. A luz se fecha nela.
_Minha irmã, você não enxerga um palmo além do nariz!  Eu amava meu irmão. Ele não, me odiava, só queria me molestar. Não sabia quanto me feria! Às vezes, eu o odiei! Ele me chamava de alienada, pior; chamava-me de:
“A b e s t a l h a d a!”

Cena 5
A atriz se olha num espelho, como se tivesse encontrado um sentido.
_Acho que meu irmão tinha toda razão? Vai ver que sou mesmo maluca. Ele sempre me disse que eu nunca tive nada na cachola. Estava certíssimo! Nunca tive nada, nadinha! O bicho, com certeza, comeu meus nerônios.

Cena 6
Vozes do além. Um buchicho medonho.  A atriz fixa a platéia; daí ,escuta o seu irmão nos seus devaneios. (fantasma do irmão na platéia)
“Sua m a l u c a!”
“Louca de pia!”
“Você é maluca e não adianta negar!”
“Maluca, tá me ouvindo?”
“Louquinha de marré de si!”

Cena 7
A atriz aperta os ouvidos desesperadamente. De uma hora pra outra, como se estivesse cara-a-cara com o irmão
_Meu irmão, quer saber? Sou louca mesmo e daí? Todo mundo é louco mesmo. Um a mais ou a menos. Não é diferente com você não, viu? Sabe de uma coisa? Sou louca e você não tem nada a ver com isso, seu retardado! Quero ser louca. Gosto de ser louca. Sou louca, mas sou feliz, mais louco é quem me diz.

Cena 8
A atriz, nesse instante, se dirige a um balanço. Está muito feliz. Balança-se pra lá e pra cá. Dá gargalhada. Gargalha sem parar. De repente, mira séria numa só direção, como se alguém lhe chamasse a atenção.
_Cadê você papai? Preciso do seu amor; do seu carinho. Por que o senhor abandonou minha mãe? A gente era tão feliz! Mas, o senhor tinha que nos deixar! O senhor foi mau conosco! Puxa vida! Por que o senhor fez isso?  Como eu gostava de passear com o senhor no parquinho! Lembra-se, pai, como brincávamos de gangorra? Mamãe agora trabalha de sol a sol, ela é doméstica pra nos sustentar. Não tem tempo pra nada, muito menos pra brincar comigo. Parece uma maluca, a coitada! O senhor onde está, paizinho? Volta! Sinto muito sua falta.

Cena 9
A atriz, sem quê nem pra quê, levanta a saia. Agacha-se, mostra a vontade de fazer xixi. Ela realmente faz xixi na frente de toda platéia.
_Ai que vontade de tomar café! Tem um cafezinho aí, mãe?  Nada de me bater, viu? Eu já estou no vaso. Odeio sentar aqui, minha mãe! A sra. adora me pôr de castigo no vaso e ainda me chama de doida por fazer xixi no chão.

Cena 10
A atriz brinca enquanto faz xixi, está improvisando um desenho no chão.
_A Lília é linda! Minha amiga do peito! Tola! Pensa que eu não sei que roubou meu namorado! Aquele outro, somente me fazia de boba. Mas quem era bobo era ele. Sempre soube de suas pilantragens com minhas amigas. Santinho do pau o-c-o!

Cena 11
A atriz faz de conta que confidencia com a platéia
-Ei, não digam pra ele não, senão o pau vai quebrar. Ele vai querer me bater. Ele não pode nem sonhar. A mãe dele há anos ficou louca; depois que o filho caçula morreu de overdose.

Cena 12
A atriz estatela-se no chão. Enquanto isso, chupa os próprios dedos. Encarna-se na pele dum bebê. Chora.
...
De repente para de chorar e grita:
_Que danado foi isso, meu amor? Tá louco, é? Penso que o fim de todo mundo é o hospício. Também, as pessoas são umas tontas, não fazem coisa com coisa. Creio nisso, somente eu me safarei porque sou a neném da mamãe.
_Glu...glu, gla...gla

Cena 13
Finalmente, enrosca-se como se estivesse no útero de sua mãe.
Ali fica, cada vez mais enrolada, parecendo mais um caracol. Ali ela apenas quer ficar na paz. Vivenciar o momento placenta.

O Bicho Homem


Sofisticou-se pacas
Ganhou duas outras patas
Se não está com elas, não sai à esquina
É uma triste sina!

Engraçado quando está descalço
É uma piada! Ótimo!
Não olha o seu próximo
Parece até troglodita, moço!

Vive à sete chaves em sua própria casa
Isola-se. É uma lástima!
Sua residência toda rodeada de rede elétrica
Igual quartel general, tanto a parafernália.

Metamorfoseou-se..., virou a sensação
Pinta o cabelo, a sobrancelha
Estica-se com botox; se abrutalha
Faz lipoaspiração.

Sua vida é criar sofisticação
Tem microondas pro rango descongelar
Come, quase sempre, self-service no jantar
Comida pronta e ostentação.

Compulsivo nas compras; não chora
O cartão de crédito na hora
O bom mesmo é se endividar
Gasta o que não dar.

Viva o capitalismo!
Sua vida é consumismo
Quiçá chegue a algum lugar
Onde será que vai parar?!

Ligado ao celular 24h; é uma praga
Não sabe viver mais sem a tal geringonça
No carro, o falatório periga
Ele pira geral.

Sua rotina é um ócio
O game seu negócio
Cantando no Karaokê
Quer mais, ou tá de convessê?

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Forrobodó waldoniano




Fui num forrobodó
Lá na casa de seu Zé
Um caba só
Potencial de mil gogó
Waldonis, cearense lascado
Fazia um passeio, pela zoropa, arretado.


Eta, forrobodó da peste!
O fole descontrolado
Oito baixos de bonito tom
Propalando o sonho do caboco
Do sertão nordestinense
Para o Brasil, agalopando.

Revive, daí, a memória do maior caba-da-peste
Gonzagão, Rei do baião
Cantador, político no jeito
De fazer canção
Defendendo o sertanejo, do desprezo
Da fome, miséria e tropeços.

Letra, música e borogodó
Experiência e tradição
Sem a dita exploração da mulher
Pé-de-serra e do bom
Rala-bucho num capricho. 




quarta-feira, 22 de agosto de 2012

EU NEGO




Negar já faz parte de nossa índole; e da nossa história, e não posso deixar passar o que me aconteceu ontem (21/08). É o seguinte: Fui assistir ao espetáculo A Matéria do sonho, dirigido por Jorge Bweres, composição teatral (projeto misto pelo Grupo Iamaká – Instrumental da UFPB e o grupo teatral Lavoura), que aconteceu no Espaço Cultural Cabo Branco; do projeto Terça Tem.
Até aí nada de especial. Um programa comum, para uma pessoa super comum. Mais uma filha de Deus!
Explico-lhes todo drama: Estava previsto pra começar às 20hs, eu já cheguei atrasada. E somente abriram a portaria lá pra umas 20:30hs.; adentrei e fiquei ali mais do que ansiosa pra ver aquele show de peça. Sim, porque era o que tudo indicava.
Pois muito bem, inicia-se. De pronto, o instrumental Iamaká muito à vontade; ficamos ao sabor dos cancioneiros renascentistas dos séculos XVI E XVII, creio que por cerca de meia hora. Daí, começa a performance sobre o universo de Dom Quixote, do escritor Miguel de Cervantes. Tudo como manda o figurino; inclusive, com três solistas vocais, na beca (indumentária a caráter) e mais, cantando em castellano.  Até aí, nada de tão especial! Entra o ator André Morais com perfeita intepretação; encarna o Cavaleiro andante divinamente. Tudo nos conformes!
Seria ótimo, se não fosse as precariedades do palco: pequeno demais para o proposto. O ator se reinventa num espacinho de nada ali mesmo entre as poltronas e o palco, restrito e acanhado. Mas, alcança o intento com maestria.
Entretanto, saio chocada daquele que poderia ter sido um momento de grande enlevo. Pois é. Conto-lhes tudo, tudinho; o porquê de minha frustração. O evento, como de costume aqui em nossa cidade, começa atrasado, sem nenhum respeito aos espectadores.  Depois, com a cena dramatúrgica iniciada, os retardatários continuam entrando; por todo ínterim do espetáculo, pessoas entrando e saindo; parecendo mais uma casa de mãe-Joana. Mas, o pior estava por vir, adentra ao recinto, e fica por uns 10 minutos ao mesmo nível de cena, um dos seguranças daquele espaço cultural, aviltando o espaço cênico, e quebrando toda e qualquer catarse de liberdade e amor propalados pelo texto quixotesco.
Por todos esses fatos insensíveis, eu Nego. Nego a toda essa insensibilidade! Nego a pobreza espiritual das pessoas que lidam com arte seja ela qual for!  Nego àqueles que fazem teatro sem levar o teatro a sério, simplesmente pelo seu superego! Nego ao teatro medíocre que é feito, ainda, em nossa cidade ou em outro qualquer lugar!
Concluindo, quero mais do Teatro pessoense!

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Índio quer apito




Todo dia é dia de índio em Jampa!As nossas sestas são feitas, toda tarde, numa rede; o feijãozinho só vale, se misturado com uma deliciosa farinha; gostamos da orla, damos sempre nossas passeadinhas; não esquecemos, na rotina diária, do pescado, da orelha furada, de pintarmos as unhas e os cabelos. Eu quero mesmo esses índios chupando manga; prá índio falta só o abacaxi! Ah, índio não gosta de ananás? Então não farta nada, nadinha! Porém, todo dia é dia de índio em Jampa! Faço um bobó de camarão com muitos ingredientes gostosos e dou cor com açafrão; não deixo de cozer uma macaxeira molinha e fazer um bom pirão. Tenho que ter muita inspiração na hora de comer e dividir a tapioca com os indinhos. Irmãos de fé, de moleza e de tesão. De ser e de não-ser. Há muitas coisas que fazem nossa comunhão. Acompanhem meu raciocínio: Essa raça muito esquecida faz parte de nossa colonização. Ela não quer apito, quer mais é qualidade de vida. Conforto, alimentação, educação e também consideração prá seus filhos. Saibamos compartilhar com essa gente renegada. Não sejamos ingratos com quem mais nos presenteou com seus dons e bens. Ganhamos desde as raízes, o desprendimento, as lendas, o folclore, a gastronomia, ou melhor, muitas coisas foram deles absorvidas na nossa vida. Não podemos ser um povo sem memória; precisamos dar valor prá sentirmos dignidade e justiça da nossa história. Essa gente desde sempre foi marginalizada. Preenchamos logo esse parêntese! Chegou a hora! Façamos a esses irmãozinhos o que eles nos fizeram, deram-nos a vida sem nada pedir em troca. Sua generosidade foi tamanha que os séculos se passaram, e nada nosso exigiram. Chegou nossa hora! Minha gente, façamos nossa parte! Pois todo dia é dia de índio em Jampa! Os índios precisam urgentemente serem reconquistados por nós!