terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Galinha domingueira


Colombo era o galo mais requisitado da redondeza. Era também o que marcava melhor o espaço em que morava. O seu cantar era a glória do seu galinheiro. Eu, Irmenegarda, a galinha mais formosa do lugar, arrastava as duas asas por ele.
Depois de muitas piscadelas, ficamos bons amigos. Papo ia, papo vinha. Aquela amizade era mais do que uma simples amizade, dava pra se perceber. Colombo cada dia mais atencioso, jogando todo seu charme pra cima de mim.
Como era de costume, eu, como galinha de respeito, ficava só esperando o dia D, ou seja, a hora dele me pedir em namoro. Não deu outra. Numa bela noite de lua cheia e o céu estrelado, Colombo veio ao meu encontro e sussurrou ao meu ouvido que me queria pra namoro. Claro que minha resposta foi sim. Quem não aceitaria um pedido daquele.
Entre namoro, noivado e casamento não se passaram nem três meses. Nós não queríamos protelar por muito mais tempo a nossa união. Era um suplício toda noite quando nos despedíamos.
Casamos. Foi aquela festança. Após dois meses, apareci prenha. Ganhei uma fofa. Nossa filha Gertrude era a cara do pai. Tinha até as manchas vermelhas na penugem como o pai. Nosso galinheiro ficou em festa uma semana. O pai todo orgulhoso, dizia:
_ Não é que a Gertrudinha é a minha cara! Meu tesouro, obrigado por me fazer o galo mais feliz!
Nosso ninho de amor estava completo. Minha filhinha Gertrude nasceu saudável. Meu parto foi normalíssimo. Daí, a rotina aos poucos volta ao normal.
A partir de algum tempo, Colombo muda muito o seu comportamento em casa, e especialmente para comigo. Eu não podia falar nem com um frangote, que era aquela ciumeira. Quando estava atacado, dava patadas em mim; era super grosso. Chegou inclusive a quase a me decapitar. Não dava pra compreender aquela mudança tão radical.
Sua metamorfose era a olhos vistos. O seu canto matinal passara a ser um misto de dor e angústia. A vizinhança já comentava:
_ O Compadre galo Colombo não é mais nem a sombra do que foi. O seu canto, outrora, tão potente; agora parece mais um choro de marica.
Realmente Colombo havia mudado. Ele vivia enciumado. E também deu pra beber. Chegava altas horas do Bar Carijó todas as noites. Nossa vida havia se transformado da água pro vinho. Pra completar, fiquei grávida novamente.
Com a chegada do segundinho, Celestino, as coisas se complicaram muito mais. Daquela galinha que eu era, não restava mais nem as penas, pois nas brigas homéricas que tínhamos, quase me escapelava toda. Eu não sabia o que fazer. Foi quando no auge do desespero, enxotei-o de nosso cafofo. Ele que fosse embora do nosso galinheiro. A porta da rua era a serventia da casa; e ainda fora incentivado:
_ Saia da minha vida e seja muito feliz.
Separamo-nos naquela hora mesmo. Minha vida ficou que era uma tristeza só, porém não era mais possível aquele inferno.
Hoje depois de anos, a minha Gertrude já casada com Coricocó e o Celestino, meu caçula, na marinha, não sou nada. E ainda, prefiro ser jogada numa panela e temperada pelas mãos de uma patroa qualquer.

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